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Paisagem verde no Pantanal: a falsa sensação de estar tudo normal

Quem tem nos acompanhado sabe que desde o ano passado a pauta aqui é quase única: As queimadas no Pantanal. O bioma foi assolado por umas piores secas da história e como consequência, mais de 4,5 milhões de hectares do mesmo foi devastado pelas chamas.

Cenas trágicas e que nunca serão esquecidas. Um bioma que antes era marcado pelo verde, naquele momento se tornou cinza e triste.

 

Parque Estadual Encontro das Águas, Setembro de 2020 com mais de 86% de sua área queimada. Foto: Gustavo Figueiroa

 

Alguns meses se passaram e quem visitou a região recentemente notou a clara diferença do cenário tão noticiado ano passado. O Pantanal voltou a ficar verde. Mas será que está tudo bem?

A Botânica, especialista em vegetação aquática no Pantanal e também conselheira do SOS Pantanal, Edna Scremin Dias, nos explicou melhor essa problemática. Vem entender o porque esse verde que conseguimos enxergar hoje na vegetação do Pantanal não é sinônimo de que o bioma já se recuperou.

 

Parque Estadual Encontro das Aguas, fevereiro de 2021. Foto: Gustavo Figueiroa

 

Cheias e secas

O Pantanal é um bioma regido por períodos de secas e cheias. Para manter a saúde do Pantanal, esses períodos devem estar equilibrados. Nem muita seca, nem muita cheia.

Ano passado foi um período de extrema seca. Sem água, grande parte da vegetação associada às áreas alagadas morreram, gerando um acúmulo enorme de matéria orgânica. O que significa, na prática, muito combustível para o fogo. Quando os incêndios começaram, foi fácil se alastrar por todo lado.

Com tudo muito queimado, o aspecto cinza chama mesmo a atenção. Parece ser o fim. Mas sabemos que a vegetação é resiliente e esse verde que estamos vendo agora veio para provar isso? Certo? Em partes. 

A vegetação é sim, resiliente e tolerante a um certo nível de queimadas, mas quando o fogo persiste por tanto tempo assim, ele se torna realmente devastador e causa estragos que os pesquisadores ainda não são capazes de mensurar.

 

Parque Estadual Encontro das Aguas, fevereiro de 2021. Foto: Gustavo Figueiroa

 

O que significa esse verde que vemos então?

Esse verde que podemos perceber é devido à vegetação primária e as lianas.

As vegetações primárias são aquelas primeiras a colonizar o terreno. São plantas de crescimento rápido e que não precisam de muito recurso para sobreviver. Então mesmo em solos pobres, essas plantinhas se sobressaem. Elas são pouco afetadas pelas ações do homem, como o fogo, por exemplo.

Já as lianas são plantas da família das trepadeiras e dos cipós que germinam no chão, se mantendo fixas no solo pelas raízes, mas que precisam de suporte para crescer em direção a luz.

Pesquisadores que estudam alagamento e fogo já conseguiram demonstrar que, após queimadas, são elas, a vegetação pioneira e as lianas, que saem em vantagem. O crescimento dessas plantas é favorecido pelo fogo e mesmo que algumas partes de suas estruturas sejam queimadas, assim que vem a chuva, elas re-brotam com tudo.

 

Vegetação coberta por lianas (cipós) no Parque Estadual Encontro das Aguas, fevereiro de 2021. Foto: Gustavo Figueiroa

 

É aí que está o problema

Com esse crescimento rápido, a vegetação primária e as lianas podem acabar afetando negativamente as outras espécies, crescendo por cima delas, competindo por recursos e as matando. 

 

A falsa sensação que o verde nos traz

Esse verde todo nos causa a falsa impressão de que o ambiente está recuperado, mas ele não está. Para que o ambiente realmente se recupere, leva tempo. O processo completo de sucessão da vegetação é longo e algumas espécies podem nunca mais ter a capacidade de retornar.  Para termos certeza dos reais impactos precisamos estudar toda a estrutura da comunidade e como ela está reagindo a esse processo.

 

Parque Estadual Encontro das Aguas em comparação. Foto de cima – setembro de 2020, foto de baixo – fevereiro de 2021. Fotos: Gustavo Figueiroa

 

Além da flora

Além do impacto que o fogo causou na flora, a fauna, fungos e bactérias associados ao ecossistema atingido também foram profundamente modificados e perturbados. Dependendo da intensidade do fogo no local e por pior que seja a notícia, pode ser que o ambiente como um todo nunca mais volte a ser como era antes. 

 

Jacaré queimado ao lado da Transpantaneira em setembro de 2020. Foto: Gustavo Figueirôa

 

Agora nos resta lutar para que novos desastres como esse não aconteçam, dar tempo ao tempo a mãe terra e repassar essa informação para que mais pessoas entendam que NÃO ESTÁ TUDO BEM.

Texto por: Fernanda Sá